“Eu estarei convosco”

Cristo, com sua Ressurreição e Ascensão, indica aos cristãos: “Sereis minhas testemunhas”. Agora, transformar o mundo, com a ajuda do Ressuscitado, é tarefa de todos. Assim o recordava Mons. Álvaro del Portillo em um artigo do qual publicamos um trecho no dia do aniversário de seu falecimento.

A tarefa que recebeu um punhado de homens no Monte das Oliveiras, próximo a Jerusalém, durante uma manhã primaveril ali pelo ano 30 de nossa Era, tinha todas as características de uma "missão impossível". Recebereis o poder do Espírito Santo que descerá sobre vós e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia, na Samaria e até os confins da terra (At 1, 8).

As últimas palavras pronunciadas por Cristo antes da Ascensão pareciam uma loucura. Desde um recanto perdido do Império romano, uns homens simples —nem ricos, nem sábios, nem influentes— teriam que levar a todo mundo a mensagem de um executado com a pena de morte.

Menos de trezentos anos depois, uma grande parte do mundo romano tinha-se convertido ao cristianismo. A doutrina do Crucificado tinha vencido as perseguições do poder, o desprezo dos sábios, a resistência a umas exigências morais que contrariavam as paixões. E, apesar dos vai-e-vens da história, ainda hoje o cristianismo segue sendo a maior força espiritual da humanidade. Só a graça de Deus pode explicar isto. Mas a graça atuou através de homens conscientes de que estavam investidos de uma missão e a cumpriram.

Cristo não apresentou a seus discípulos esta tarefa como uma possibilidade, e sim como um mandato imperativo. Assim lemos em São Marcos: Ide por todo mundo e pregai o Evangelho a toda criatura. O que crer e se batize, se salvará; mas o que não crer, se condenará (Mc 16, 15-16). E São Mateus recolhe as seguintes palavras de Cristo: Ide e ensinai a todas as gentes, batizando-as em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, lhes ensinando a guardar todo o que vos mandei. Eu estarei convosco até o fim do mundo (Mt 28, 19-20).

São palavras que trazem a nossa memória as pronunciadas por Jesus na Ultima Ceia —como Tu me enviaste ao mundo, assim Eu os enviei ao mundo (Jo 17, 18)—, das quais o Concílio Vaticano II fez o seguinte comentário: “Este mandato solene de Cristo de anunciar a verdade salvadora, a Igreja o recebeu dos Apóstolos com a missão de levá-lo até os confins da terra"[1]. (...)

Os primeiros cristãos souberam transformar sua sociedade, colocando todo seu esforço ao serviço do mandato de Cristo: Então, eles partiram e pregaram por todas partes, enquanto o Senhor estava com eles e confirmava a palavra com os prodígios que a acompanhavam (Mc 16, 20).

Ante uma sociedade que parece fugir loucamente de Deus, os cristãos deste século fomos chamados a realizar uma nova evangelização “Em e desde as tarefas civis, materiais, seculares da vida humana: em um laboratório, na sala de cirurgia de um hospital, no quartel, na cátedra universitária, na fábrica, na oficina, no campo, no lar de família e em todo o imenso panorama do trabalho, Deus nos espera a cada dia. Sabei-o bem: há algo santo, divino, escondido nas situações mais comuns, que toca à cada um de vós descobrir”[2].

E, com palavras de João Paulo II, “Isto só será possível se os fiéis leigos souberem superar em si mesmos a fissura entre o Evangelho e a vida, recompondo em sua atividade quotidiana na família, no trabalho e na sociedade a unidade de vida que encontra no Evangelho inspiração e força para se realizar em plenitude”[3]. O mundo espera cristãos sem fissuras, cristãos de uma só peça. Com falhas, com erros, mas com a firme vontade de retificar quanta vezes for necessário e seguir adiante no caminho que, da mão da Virgem, nos leva ao Pai através de Cristo, Caminho, Verdade e Vida.

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(Artigo publicado em "Catholic Familyland", Issue XXVII, pp. 11-14).

[1] Concilio Vaticano II, Const. dogm. Lumen gentium, n. 17.

[2] Josemaria Escrivá, Questões Atuais do Cristianismo, n. 114.

[3] João Paulo II, Exhort. apost. Christifideles laici, n. 34.