Filho de pai anglicano e mãe católica, Anthony Babafemi Ogunsanya nasceu em Lagos há 33 anos. Estudou no Colégio São Gregório, onde companheiros católicos “despertaram meu interesse pela fé”. Mais tarde estudou engenharia na Universidade Obafemi Awolowo, e uma vez licenciado, em 1997, fez as malas e deixou a Nigéria. Seu primeiro destino foi a Espanha, e mais tarde Roma, com o propósito de estudar filosofia e teologia.
A quem você deve sua vocação sacerdotal?
Como é lógico, ao Senhor. Toda vocação parte da infinita misericórdia de Deus. Não há dúvida, por outro lado, de que o Senhor se serve normalmente de muitas pessoas quando quer chamar um filho seu para uma entrega especial. O fundador do Opus Dei, que teve um papel decisivo na minha vocação, dizia que 90% dela devemos a nossos pais, querendo expressar de um modo gráfico que o agradecimento aos pais deve ser muito grande. Ainda assim, observando a história de minha família, que durante alguns anos teve uma vida agnóstica, posso dizer que a Virgem esteve sempre presente através de meu avô materno. Eu sabia que rezava todos os dias o rosário, e quando íamos vê-lo nos convidava a rezar com ele.
Que reações causou sua ordenação entre parentes e amigos?
Penso que todos estão muito contentes. O ambiente em que vivi, graças a Deus, sempre se caracterizou por um grande respeito à liberdade. Em minha casa jamais colocaram obstáculos a questões relacionadas com a fé, nem quando decidi deixar de assistir às cerimônias anglicanas, nem tampouco depois com minha vocação ao Opus Dei. Somente o valor da educação não podia ser discutido por nenhum dos quatro filhos, e o tempo mostrou a razão disso. “O que te sustentará é tua formação”, diziam, para animar-nos a estudar bem e com responsabilidade.
Você vive na Europa desde 1998. Como vê um africano o Velho Continente?
É uma pergunta difícil, que sempre evito responder. Não gosto de fazer juízos gerais, porque é fácil equivocar-se ou ofender. Feita esta premissa, penso que o que mais surpreende um africano que chega à Europa é a tristeza de alguns rostos. Falta um pouco mais de alegria.
E como você vê a África a partir da Europa?
A África é um grande continente que viveu e vive momentos históricos difíceis, com guerras sangrentas e com zonas castigadas brutalmente pela pobreza. Apesar disso, a África não é só miséria; é muito mais do que isso, estou convencido de que é um continente com valores e com sinais claros que convidam a ter esperança, também para a fé. Para mim é muito significativo que, no século passado, Deus tenha olhado com amor para os africanos, suscitando grandes missionários. Milhares de homens e mulheres que deram sua vida pela África, inclusive morrendo mártires. Como disse o Papa Bento XVI, é de esperar que a Igreja recolha os frutos precisamente nestes lugares onde mais se sofreu por Cristo. O Papa João Paulo II, vislumbrando essa “nova época missionária”, exortou os africanos: “Não somente salvar a África com a África, mas também evangelizar outros povos com missionários africanos”.
Você fez em Roma sua tese doutoral sobre o magistério de Paulo VI, concretamente sobre a participação dos fiéis leigos na vida política. No atual debate cultural e político, qual é a questão mais crítica que o fiel laico deve enfrentar?
Entendo que sua pergunta se refere à Europa ou ao Ocidente em geral. O ponto crítico do debate é o relativismo cultural, como assinalou recentemente o Papa, consequência do pluralismo ético. Por desgraça, são muitos os que reivindicam a mais completa autonomia para suas próprias referências morais; por outra parte, entretanto, os legisladores crêem que respeitam esta liberdade quando formulam leis que prescindem dos princípios da ética natural, como se todas as possíveis concepções da vida tivessem igual valor. Estudando a doutrina social da Igreja e o magistério de Paulo VI, pude constatar que a fé nunca pretendeu encerrar os conteúdos sócio-políticos em um esquema rígido. Por sua vez, a Igreja ensina que a autêntica liberdade não existe sem a verdade. Penso que este é outro ponto importante que um fiel leigo deve ter presente. A vida política implica considerar a dimensão histórica em que o homem vive, habitualmente em situações imperfeitas, que deve tentar modificar através dos meios lícitos que a ordem jurídica e democrática coloca à disposição de todos os membros da comunidade política.
Pensa retornar logo para a Nigéria?
Certamente desejo, ainda que eu bem poderia ser uma dessas pessoas em que pensava João Paulo II quando falava que os africanos deveriam evangelizar outros povos. Como é habitual, será meu prelado que julgará qual é o lugar onde a Igreja e meus irmãos, os homens, precisam de mim. Como sacerdote somente desejo servir as almas, sem direção alguma. Neste verão tenho previsto realizar algumas tarefas pastorais na Espanha e é possível que mais tarde retorne ao meu país.
Que lembranças levará de Roma?
Muitas, muitíssimas. Quem sabe a recordação mais forte nestes momentos seja o dia do traslado do féretro de João Paulo II da Sala Clementina até a Basílica de São Pedro. Como diácono pude participar da cerimônia do traslado e ver o Papa muito de perto, acompanhá-lo, rezar de um modo muito singular em meio à multidão que enchia a Praça. De todo modo, levarei a lembrança de Roma como Roma, uma cidade única no mundo. Agora entendo aqueles que dizem que é impossível deixar Roma: seria renunciar a algo que te pertence intimamente, tão profundo que é difícil explicar, sobretudo para uma mente de engenheiro como a minha. Os poetas saberiam explicar melhor.