Assunção: "No Céu temos uma Mãe, o Céu tem um coração"

“O homem é grande somente se Deus é grande. Com Maria devemos começar a compreender que é assim”. Publicamos a homilia que Bento XVI pronunciou ao presidir a Missa da Solenidade da Assunção de Nossa Senhora na Paróquia de São Tomás de Villanova, em Castelgandolfo.

Caros Irmãos no Episcopado e no Sacerdócio,

Queridos Irmãos e Irmãs:

Antes de mais nada, dirijo uma cordial saudação a todos vós. É uma grande alegria para mim celebrar a Missa nesta bela igreja paroquial, no dia da Assunção. Saúdo o Cardeal Sodano, o Bispo de Albano, todos os sacerdotes, o Presidente da Câmara e todos vós. Obrigado pela vossa presença. A festa da Assunção é um dia de alegria. Deus venceu. O amor venceu. Venceu a vida. Mostrou-se que o amor é mais forte do que a morte. Que Deus tem a verdadeira força, e a sua força é bondade e amor.

Maria foi elevada ao Céu em corpo e alma. Para nós, o Céu já não é uma esfera muito distante e desconhecida. No Céu temos uma mãe. O Céu está aberto, o Céu tem um coração.

Maria foi elevada ao Céu em corpo e alma: também para o corpo existe um lugar em Deus. Para nós, o Céu já não é uma esfera muito distante e desconhecida. No Céu temos uma mãe. E a Mãe de Deus, a Mãe do Filho de Deus, é a nossa Mãe. Ele mesmo o disse. Ele a constituiu nossa Mãe, quando disse ao discípulo e a todos nós: "Eis aí a tua Mãe!" No Céu temos uma Mãe. O Céu está aberto, o Céu tem um coração.

No Evangelho ouvimos o Magnificat, esta grande poesia pronunciada pelos lábios, ou melhor, pelo coração de Maria, inspirada pelo Espírito Santo. Neste cântico maravilhoso reflete-se toda a alma, toda a personalidade de Maria. Podemos dizer que este seu cântico é um retrato, é um verdadeiro ícone de Maria, no qual podemos vê-la precisamente como é.

Gostaria de realçar somente dois pontos desse grande cântico. Ele começa com a palavra "Magnificat": a minha alma "engrandece" o Senhor, ou seja, "proclama grande" o Senhor. Maria deseja que Deus seja grande no mundo, seja grande na sua vida, esteja presente entre todos nós. Não teme que Deus possa ser um "concorrente" na nossa vida, que nos possa tirar algo da nossa liberdade, do nosso espaço vital com a sua grandeza. Ela sabe que, se Deus é grande, também nós somos grandes. A nossa vida não é oprimida, mas elevada e alargada: justamente então se torna grande no esplendor de Deus.

O fato de os nossos antepassados pensarem o contrário foi o núcleo do pecado original. Temiam que, se Deus fosse grande demais, tiraria algo da sua vida. Pensavam que deveriam pôr Deus de lado a fim de ter mais espaço para eles mesmos. Esta foi também a maior tentação da época moderna, dos últimos três ou quatro séculos. Cada vez mais pensou-se e se disse: "Mas este Deus não nos deixa a nossa liberdade, torna estreito o espaço da nossa vida com todos os seus mandamentos. Portanto, Deus deve desaparecer; queremos ser autônomos, independentes. Sem este Deus, nós mesmos seremos deuses, fazendo o que nós quisermos".

Este era também o pensamento do filho pródigo, que não entendeu que, precisamente pelo fato de estar na casa do pai, era "livre". Foi-se embora para cidades longínquas e consumiu o patrimônio da sua vida. No final compreendeu que, justamente por se ter distanciado do pai, em vez de ser livre, tornou-se escravo; entendeu que somente retornando à casa do pai poderia ser livre verdadeiramente, em toda a beleza da vida.

Assim é também na época moderna. Antes se pensava e se acreditava que, afastando Deus e sendo autônomos, seguindo somente as nossas idéias, a nossa vontade, nos tornaríamos realmente livres, podendo fazer quanto quiséssemos sem que ninguém pudesse dar-nos alguma ordem. Mas, onde desaparece Deus, o homem não se torna grande; ao contrário, perde a dignidade divina, perde o esplendor de Deus no seu rosto. Converte-se ao final no produto de uma evolução cega, de que se pode usar e abusar. Foi precisamente isso que a experiência da nossa época confirmou.

Somente se Deus é grande, o homem também é grande. Com Maria devemos começar a entender que é assim. Não devemos distanciar-nos de Deus, mas tornar Deus presente; fazer com que Ele seja grande na nossa vida; assim também nós nos tornamos divinos; todo o esplendor da dignidade divina então é nosso.

Apliquemos isto à nossa vida. É importante que Deus seja grande entre nós, na vida pública e na vida privada. Na vida pública é importante que Deus esteja presente, por exemplo, através da Cruz nos edifícios públicos; que Deus esteja presente na nossa vida comum, porque somente se Deus está presente temos uma orientação, uma estrada comum; do contrário os contrastes tornam-se inconciliáveis, deixando de existir o reconhecimento da dignidade comum. Tornemos grande Deus na vida pública e na vida privada. Isto significa dar espaço todos os dias a Deus na nossa vida, começando de manhã com a oração, e depois dando tempo a Deus, dando o domingo a Deus. Não perdemos o nosso tempo livre se o oferecemos a Deus. Se Deus entra no nosso tempo, todo o tempo se torna maior, mais amplo, mais rico.

Maria era invadida pela luz divina e por isso era tão esplêndida, tão bondosa, tão radiante de amor e de bondade

Segunda observação. Esta poesia de Maria, o Magnificat, é toda original; contudo, ao mesmo tempo, é um "tecido" feito totalmente com "fios" do Antigo Testamento, feito da palavra de Deus. Dessa maneira, vemos que Maria estava por assim dizer, "em casa" na palavra de Deus, vivia da palavra de Deus, estava imbuída da palavra de Deus. Na medida em que falava com as palavras de Deus, pensava com as palavras de Deus, os seus pensamentos eram os pensamentos de Deus, as suas palavras as palavras de Deus. Era invadida pela luz divina e por isso era tão esplêndida, tão bondosa, tão radiante de amor e de bondade. Maria vive da palavra de Deus, é inundada pela palavra de Deus. E este estar imersa na palavra de Deus, este ser totalmente familiar à palavra de Deus, dá-lhe também a luz interior da sabedoria. Quem pensa com Deus pensa bem, e quem fala com Deus fala bem. Tem critérios de juízo válidos para todas as coisas do mundo. Torna-se sábio, prudente e, ao mesmo tempo, bom: torna-se também forte e corajoso, com a força de Deus que resiste ao mal e promove o bem no mundo.

E, assim, Maria fala conosco, fala a nós, convida-nos a conhecer a palavra de Deus, a amar a palavra de Deus, a viver com a palavra de Deus, a pensar com a palavra de Deus. E podemos fazê-lo de diversíssimos modos: lendo a Sagrada Escritura, sobretudo participando na Liturgia, na qual no decurso do ano a Santa Igreja nos abre diante todo o livro da Sagrada Escritura. Abre-o para a nossa vida e torna-o presente na nossa vida.

Penso ainda no "Compêndio do Catecismo da Igreja Católica", que recentemente publicamos, no qual a palavra de Deus é aplicada à nossa vida, interpreta a realidade da nossa vida, ajuda-nos a entrar no grande "templo" da palavra de Deus, a aprender a amá-la e a estar, como Maria, imbuídos desta palavra. Desse modo a vida torna-se luminosa e temos critério para julgar, recebemos bondade e força ao mesmo tempo.

Agota Maria distante de nós? Pelo contrário: precisamente porque está com Deus e em Deus, está pertíssimo de cada um de nós

Maria é elevada em corpo e alma à glória do Céu e, com Deus e em Deus, é Rainha do Céu e da terra. Porventura está tão distante de nós? Pelo contrário: precisamente porque está com Deus e em Deus, está pertíssimo de cada um de nós. Quando estava na terra podia somente estar perto de algumas pessoas. Estando em Deus, que está próximo de nós, que está no "interior" de todos nós, Maria participa nesta aproximação de Deus. Estando em Deus e com Deus, está perto de cada um de nós, conhece o nosso coração, pode ouvir as nossas orações, pode ajudar-nos com a sua bondade materna e é-nos dada, como disse o Senhor, como "mãe", à qual podemos dirigir-nos em todos os momentos. Ela escuta-nos sempre, está sempre perto, e, sendo Mãe do Filho, participa no poder do Filho, na sua bondade. Podemos confiar sempre toda a nossa vida a esta Mãe, que não está longe de nós.

Neste dia de festa, demos graças ao Senhor pelo dom da Mãe e rezemos a Maria, a fim de que nos ajude a encontrar o caminho justo todos os dias. Amém.