“A fé transmite-se no silêncio dos que a vivem com autenticidade”

A revista Omnes publicou uma entrevista a Esteban Aranaz, sacerdote diocesano de Taraçona (Saragoça), que pertence à Sociedade Sacerdotal da Santa Cruz e exerce o seu ministério pastoral na Ásia desde há 23 anos.

O Pe. Esteban Aranaz, sacerdote da diocese de Taraçona, dedicou mais de duas décadas à missão na Ásia, primeiro em Taiwan durante sete anos e, desde há uma década, em Xangai.

Entrevista original em Omnes (Javier García Herrería)

O seu trabalho pastoral concentra-se no atendimento da comunidade católica de língua espanhola e portuguesa, além de viajar regularmente a Pequim para pregar retiros aos jovens.

Uma das grandes preocupações com a Igreja clandestina chinesa são as restrições a sacerdotes estrangeiros no país, embora, segundo conta Aranaz, a sua situação tenha melhorado nos últimos anos, permitindo que ele exerça r o seu ministério com maior estabilidade. Além disso, a sua integração na vida da Igreja local fortaleceu-se com o seu trabalho como organista na catedral de Xangai.

A Igreja na China, embora seja uma minoria, vive com grande fervor a sua fé. Calcula-se que haja entre 15 e 20 milhões de católicos, o que representa aproximadamente 1% da população, enquanto a comunidade evangélica é um pouco mais numerosa.

Uma Igreja silenciosa, mas viva

Ao contrário do Ocidente, onde muitas vezes a prática religiosa esfriou, na China a piedade é profunda e visível, afirma o Pe. Esteban. Na catedral de Xangai, por exemplo, até 700 fiéis se reúnem todos os domingos para uma liturgia solene, com grande respeito e devoção.

“A reverência pelo sagrado se manifesta em gestos significativos: muitos fiéis rezam de joelhos, mantêm as mãos juntas durante toda a Missa e participam ativamente na liturgia. A música litúrgica é especialmente valorizada na China, com coros bem preparados, que contribuem para a beleza da celebração”, conta.

Em relação ao crescimento de fiéis e às conversões, conta que “não é massivo nem ruidoso, mas discreto e baseado no testemunho cotidiano. A fé transmite-se em pequenos círculos, na confiança pessoal e no silêncio dos que a vivem com autenticidade”.

As conversões são constantes, mas o contexto requer prudência e adaptação. A Igreja na China continua a ser uma comunidade minoritária, com presença em praticamente todas as cidades do país, embora sua influência na sociedade seja limitada pela estrutura política. Em algumas províncias, como Hebei ou Xanxi, há comunidades católicas mais numerosas e templos bem cuidados. Além disso, a Igreja mantém obras sociais, como residências para idosos e orfanatos dirigidos por religiosas ou leigos comprometidos.

Relação entre a Igreja e o Estado: estabilidade e diálogo

Outro dos temas abordados nesta entrevista é o das relações entre a Igreja e o Governo chinês, que há décadas enfrenta dificuldades e complicações. Nesse sentido, Aranaz se alegra pelo acordo de 2018 entre a Santa Sé e o Governo chinês, que “permitiu normalizar a situação de muitos bispos e fortalecer a unidade da Igreja no país”.

Embora o conteúdo do acordo não seja público, o seu objetivo é preservar a comunhão eclesial e garantir que todos os bispos estejam em plena união com o Papa. Este acordo, renovado periodicamente, passa a ter uma vigência de quatro anos a partir de 2024, o que o Pe. Esteban considera um sinal positivo de estabilidade e diálogo. Este sacerdote aragonês crê que a estratégia do Papa Francisco, baseada na prudência e no diálogo, deu frutos e abriu portas que antes estavam fechadas.

Outro tema tratado é a formação do clero na China, que, segundo explica, melhorou significativamente nos últimos anos. Conta que existem seminários bem organizados em cidades como Pequim, Xangai e Shijiazhuang, este último com mais de 100 seminaristas, o que faz dele o maior do país.

Além disso, muitos sacerdotes puderam completar estudos em universidades de Roma, Alemanha, Espanha e outros países, elevando notavelmente o nível de preparação do clero chinês. Roma nunca considerou a Igreja na China como cismática, já que a sucessão apostólica se manteve intacta e a doutrina, a moral e a liturgia não sofreram alterações.

A amizade desempenha um papel fundamental na sua missão na China, algo que ele define como “o oitavo sacramento”. Ainda que o seu trabalho pastoral seja dirigido a estrangeiros, criou uma profunda relação com fiéis chineses através da arte e da música, duas das suas paixões. Em encontros como “Amigos da Beleza”, organiza tertúlias onde compartilha a riqueza cultural da China e o humanismo cristão num ambiente de fraternidade.

Apesar dos desafios, o Pe. Esteban conserva uma visão otimista sobre o futuro da Igreja na China. Acredita firmemente que a fé permanece viva e que o diálogo com as autoridades permitirá continuar a avançar. Destaca que a Igreja soube adaptar-se ao longo da história e que, ainda que o caminho seja complexo, sempre encontrará formas de evangelizar. Na sua opinião, a chave está em continuar a fomentar um espírito apostólico vibrante e fortalecer a comunhão com a Igreja universal.

O Opus Dei: um impulso no acompanhamento e formação do clero

A sua fortaleza e otimismo, segundo disse na entrevista, sustentam-se na oração. Destaca especialmente o papel do Opus Dei e da Sociedade Sacerdotal da Santa Cruz no seu acompanhamento espiritual e formação, assim como na de muitos sacerdotes em todo o mundo, valorizando a sua contribuição na preparação do clero através de instituições como a Universidade de Navarra, o Seminário Internacional Bidasoa e a Universidade Pontifícia da Santa Cruz em Roma. Formado nestas instituições, o Pe. Esteban reconhece que a sua vocação sacerdotal se enriqueceu com uma visão universal da Igreja.

Com uma profunda gratidão pela sua missão, conclui com uma declaração que resume a sua entrega total ao povo chinês: “Devemos nossa existência a Deus e a nossos pais. Fazemos parte de uma tradição com os nossos antepassados. Mas o coração só responde à liberdade do amor. E eu, porque sou livre, por amor a Cristo, decidi dá-lo para sempre ao povo chinês. Não importa onde a Providência me levar; onde estiver, quero ser sempre um chinês como os outros”.