Sacerdote para a eternidade

São Josemaria pronunciou a homilia “Sacerdote para a eternidade" no dia 13 de abril de 1973. Na sua mensagem, o fundador do Opus Dei reflete sobre a Santa Missa, a dignidade e necessidade do sacerdócio, e a relação entre sacerdotes e leigos na Igreja.

Apresentamos aqui na íntegra a homilia “Sacerdote para a eternidade”, que São Josemaria pronunciou no dia 13 de abril de 1973. Nela São Josemaria reflete sobre a Santa Missa; sobre a natureza do sacerdócio católico, a sua dignidade e necessidade; e sobre a relação entre sacerdotes e leigos na Igreja.

A homilia publicou-se no livro Amar a Igreja, juntamente com outras duas homilias pronunciadas por São Josemaria entre 1972 e 1973, quando o autor sofria intensamente pela situação da Igreja. Constituem uma manifestação entranhável de amor e fidelidade à Esposa de Cristo.


Dias atrás, ao celebrar a Santa Missa, fiz uma breve pausa para considerar as palavras de um salmo que a liturgia colocava na antífona da Comunhão: O Senhor é o meu pastor, nada me poderá faltar. Esta invocação trouxe-me à memória os versículos de outro salmo, que se recitava na cerimônia da Primeira Tonsura: o Senhor é a parte da minha herança. O próprio Cristo se põe nas mãos dos sacerdotes, que se fazem assim dispensadores dos mistérios - das maravilhas - do Senhor.

No próximo verão, receberá as Sagradas Ordens meia centena de membros do Opus Dei. Desde 1944, sucedem-se, como uma realidade de graça e de serviço à Igreja, estas ordenações sacerdotais de alguns membros da Obra. Apesar disso, todos os anos há gente que se espanta. Como é possível, interrogam-se, que trinta, quarenta, cinquenta homens, com uma vida cheia de afirmações e de promessas, estejam dispostos a fazer-se sacerdotes? Queria expor hoje algumas considerações, mesmo correndo o risco de aumentar nessas pessoas os motivos de perplexidade.

Porquê ser Sacerdote?

O santo Sacramento da Ordem Sacerdotal será ministrado a este grupo de membros da Obra que contam com uma valiosa experiência - talvez de muito tempo - como médicos, advogados, engenheiros, arquitetos ou de outras diversíssimas atividades profissionais. São homens que, como fruto do seu trabalho, estariam capacitados para aspirar a postos mais ou menos relevantes na sua esfera social.
Vão ordenar-se para servir. Não para mandar, não para brilhar, mas para se entregarem, num silêncio incessante e divino, ao serviço de todas as almas. Quando forem sacerdotes, não se deixarão arrastar pela tentação de imitar as ocupações e o trabalho dos leigos, mesmo que se trate de tarefas que conhecem bem por as terem realizado até agora, o que lhes conferiu uma mentalidade laical que não perderão nunca.
A sua competência nos diversos ramos do saber humano - da história, das ciências naturais, da psicologia, do direito, da sociologia -, embora necessariamente faça parte dessa mentalidade laical, não os levará a querer apresentar-se como sacerdotes-psicólogos, sacerdotes-biólogos ou sacerdotes-sociólogos: receberam o sacramento da Ordem para serem, nem mais nem menos, sacerdotes-sacerdotes, sacerdotes cem por cento.

É provável que sobre muitos assuntos temporais e humanos, entendam mais do que muitos leigos. Mas, desde que passaram a ser clérigos, calam com alegria essa competência para continuarem a fortalecer-se espiritualmente através da oração constante, para falarem só de Deus, para pregarem o Evangelho e administrarem os Sacramentos. Este vai ser, se assim se pode dizer, o seu novo trabalho profissional, ao qual dedicam todas as horas do dia, que sempre serão poucas, porque terão de estudar constantemente a ciência de Deus, orientar espiritualmente tantas almas, ouvir muitas confissões, pregar incansavelmente e rezar muito, muito, com o coração sempre posto no Sacrário, onde está realmente presente Aquele que nos escolheu para sermos seus -, numa maravilhosa entrega cheia de alegria, mesmo no meio de contrariedades, que não faltam a nenhuma criatura.
Todas estas considerações podem aumentar, como vos dizia, os motivos de espanto. Alguns continuarão talvez a perguntar a si mesmos: mas por que essa renúncia a tantas coisas boas e nobres da terra, a uma profissão mais ou menos brilhante, a uma influência cristã mediante o exemplo, no âmbito da cultura profana, do ensino, da economia, ou de qualquer outra atividade social?
Outros irão lembrar-se de que hoje, em não poucos lugares, grassa uma desorientação notável sobre a figura do sacerdote; tagarela-se que é preciso procurar a sua identidade e põe-se em dúvida o significado que a entrega a Deus no sacerdócio possa ter nas circunstâncias atuais.

Finalmente, também poderá surpreender alguns que, numa época em que escasseiam as vocações sacerdotais, estas surjam entre cristãos que já tinham resolvido - graças a um trabalho pessoal exigente - os problemas de emprego e trabalho no mundo.

Sacerdotes e leigos

Compreendo essa estranheza, mas não seria sincero se afirmasse que a compartilho. Esses homens que, livremente, porque assim o quiseram - e isto é uma razão muito sobrenatural -, vão abraçar o sacerdócio, sabem que não fazem nenhuma renúncia, no sentido em que ordinariamente se emprega esta palavra. Já se dedicavam - pela sua vocação ao Opus Dei - ao serviço da Igreja e de todas as almas, com uma vocação plena, divina, que os levava a santificar o trabalho habitual, a santificar-se nesse trabalho e a procurar, por meio dessa tarefa profissional, a santificação dos outros.

Como todos os cristãos, os membros do Opus Dei, sacerdotes e leigos, sempre cristãos correntes, encontram-se entre os destinatários destas palavras de São Pedro: Vós sois linhagem eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de conquista, afim de anunciardes as grandezas daquele que vos chamou das trevas para a Sua luz admirável. Vós que outrora não éreis o Seu povo, mas que agora sois o povo de Deus; vós que antes não tínheis alcançado misericórdia e agora a alcançastes.

Uma única e a mesma é a condição de fiéis cristãos nos sacerdotes e nos leigos, porque Deus Nosso Senhor nos chamou a todos à plenitude da caridade, à santidade: Bendito seja Deus e Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, que nos cumulou em Cristo com toda a espécie de bênçãos espirituais do Céu. Foi assim que n'Ele nos escolheu antes da constituição do mundo, para sermos santos e sem mácula na sua presença pelo amor.

Não há santidade de segunda categoria: ou existe em nós uma luta constante por estarmos na graça de Deus e sermos conformes a Cristo, nosso Modelo, ou desertamos dessas batalhas divinas. O Senhor convida-nos a todos, para que cada um se santifique no seu próprio estado. No Opus Dei, esta paixão pela santidade - apesar dos erros e misérias individuais - não se torna diferente pelo fato de se ser sacerdote ou leigo; e, além disso, os sacerdotes são apenas uma pequeníssima parte, em comparação com o total de membros.

Olhando com olhos de fé, a chegada ao sacerdócio não constitui, portanto, nenhuma renúncia; e chegar ao sacerdócio também não significa um coroamento da vocação para o Opus Dei. A santidade não depende do estado - solteiro, casado, viúvo, sacerdote -, mas sim da correspondência pessoal à graça, que a todos nos é concedida, para aprendermos a afastar de nós as obras das trevas e nos revestirmos das armas da luz: da serenidade, da paz, do serviço sacrificado e alegre à humanidade inteira.

Dignidade do Sacerdócio

O sacerdócio leva a servir a Deus num estado que, em si mesmo, não é melhor nem pior do que os outros; é diferente. Mas a vocação de sacerdote aparece revestida de uma dignidade e de uma grandeza que nada na terra supera. Santa Catarina de Sena põe na boca de Jesus Cristo estas palavras: Não quero que diminua a reverência que se deve professar pelos sacerdotes, porque a reverência e o respeito que se lhes manifesta, não se dirige a eles, mas a Mim, em virtude do Sangue que lhes dei para que o administrassem. Se não fosse isso, deveríeis dedicar-lhes a mesma reverência que aos leigos e não mais... Não devem ser ofendidos: ofendendo-os, ofende-se a Mim e não a eles. Por isso o proibi e dispus que não admito que toqueis nos meus Cristos.

Alguns afadigam-se à procura, como dizem, da identidade do sacerdote. Que claras são essas palavras da Santa de Sena! Qual é a identidade do sacerdote? A de Cristo. Todos nós, cristãos, podemos e devemos ser, não alter Christus, mas ipse Christus: outros Cristos, o próprio Cristo! Mas, no sacerdote, isto se dá imediatamente, de forma sacramental.

Para realizar uma obra tão grande - a da Redenção - Cristo está sempre presente na Igreja, principalmente nas ações litúrgicas. Está presente no Sacrifício da Missa, tanto na pessoa do ministro - "oferecendo-se agora por ministério dos sacerdotes aquele mesmo que se ofereceu a si próprio na cruz" -, como, sobretudo, sob as espécies eucarísticas. Pelo sacramento da Ordem, o sacerdote torna-se efetivamente apto para emprestar a Nosso Senhor a voz, as mãos, todo o seu ser: é Jesus Cristo quem, na Santa Missa, pelas palavras da consagração, transforma a substância do pão e do vinho no Seu Corpo, Alma, Sangue e Divindade.

Nisto se fundamenta a incomparável dignidade do sacerdote. Uma grandeza emprestada, compatível com a minha pequenez. Eu peço a Deus Nosso Senhor que nos dê a todos os sacerdotes, a graça de realizarmos santamente as coisas santas, e de refletirmos também na nossa vida as maravilhas das grandezas do Senhor. Nós, que celebramos os mistérios da Paixão do Senhor, temos de imitar o que fazemos. E então a hóstia ocupará o nosso lugar diante de Deus, se nós mesmos nos fizermos hóstias.

Se alguma vez encontrardes um sacerdote que, exteriormente, não parece viver de acordo com o Evangelho - não o julgueis, Deus o julga - , sabei que, se celebra validamente a Santa Missa, com intenção de consagrar, Nosso Senhor não deixa de descer até àquelas mãos, ainda que sejam indignas. Pode haver maior entrega, maior aniquilamento? Mais do que em Belém e no Calvário! Por quê? Porque Jesus Cristo tem o Coração oprimido pelas suas ânsias redentoras, porque não quer que ninguém possa dizer que não foi chamado, porque se faz encontrar pelos que não O procuram.

É Amor! Não há outra explicação. Que insuficientes se tornam as palavras para falar do Amor de Cristo! Ele rebaixa-se a tudo, admite tudo, expõe-se a tudo - a sacrilégios, a blasfêmias, à frieza da indiferença de tantos - contanto que venha a oferecer, ainda que seja a um único homem, a possibilidade de descobrir o bater de um Coração que salta no Seu peito chagado.

Esta é a identidade do sacerdote: instrumento imediato e diário da graça salvadora que Cristo ganhou para nós. Se se compreende isto, se isto é meditado no silêncio ativo da oração, como se pode considerar o sacerdócio uma renúncia? É um ganho impossível de calcular. A Nossa Mãe Santa Maria, a mais santa das criaturas - mais do que Ela, só Deus -, trouxe uma vez Jesus ao mundo; os sacerdotes trazem-no à nossa terra, ao nosso corpo e à nossa alma, todos os dias: Cristo vem para nos alimentar, para nos vivificar, para ser, desde já, penhor da vida futura.

Sacerdócio comum e sacerdócio ministerial
Nem como homem, nem como fiel cristão, o sacerdote é mais do que o leigo. Por isso é muito conveniente que o sacerdote professe uma profunda humildade, para entender como também no seu caso se cumprem plenamente, de modo especial, aquelas palavras de São Paulo: Que possuis que não tenhas recebido? O recebido... é Deus! O recebido é o poder celebrar a Sagrada Eucaristia, a Santa Missa - fim principal da ordenação sacerdotal -, de perdoar os pecados, de administrar outros sacramentos e pregar com autoridade a Palavra de Deus, dirigindo os demais fiéis nas coisas que se referem ao Reino dos Céus.

O sacerdócio dos presbíteros, que pressupõe os sacramentos da iniciação cristã, confere-se mediante um Sacramento particular, pelo qual os presbíteros, pela unção do Espírito Santo, são selados com um carácter especial e se configuram com Cristo Sacerdote de tal modo que podem atuar na pessoa de Cristo Cabeça. A Igreja é assim, não por capricho dos homens, mas por expressa vontade de Jesus Cristo, seu Fundador. O sacrifício e o sacerdócio estão tão unidos, por determinação de Deus, que em toda a Lei, na Antiga e na Nova Aliança, existiram os dois. Tendo, pois, a Igreja Católica recebido no Novo Testamento, por instituição do Senhor, o sacrifício visível da Eucaristia, deve-se também confessar que há nEla um novo sacerdócio, visível e externo, no qual foi transferido o antigo.

Nos que são ordenados, este sacerdócio ministerial soma-se ao sacerdócio comum de todos os fiéis. Portanto, se seria um erro defender que um sacerdote é mais cristão do que qualquer outro fiel, pode-se porém afirmar que é mais sacerdote: pertence, como todos os cristãos, a esse povo sacerdotal redimido por Cristo e, além disso, está marcado com o carácter do sacerdócio ministerial, que se distingue essencialmente, e não apenas em grau, do sacerdócio comum dos fiéis.

Não compreendo o empenho de alguns sacerdotes em se confundirem com os outros cristãos, esquecendo ou descuidando a sua missão específica na Igreja, para a qual foram ordenados. Pensam que os cristãos desejam ver no sacerdote um homem como os outros. Não é verdade. No sacerdote, querem admirar as virtudes próprias de qualquer cristão e de qualquer homem honrado: a compreensão, a justiça, a vida de trabalho - trabalho sacerdotal neste caso -, a caridade, a educação, a delicadeza no trato. No entanto, juntamente com isto, os fiéis pretendem que nele se destaque claramente o carácter sacerdotal.

Esperam que o sacerdote reze, que não se negue a administrar os Sacramentos, que esteja disposto a acolher a todos sem se arvorar em chefe ou militante de partidarismos humanos, sejam de que tipo forem; que ponha amor e devoção na celebração da Santa Missa, que se sente no confessionário, que conforte os doentes e os aflitos, que ensine catequese às crianças e aos adultos, que pregue a Palavra de Deus e não qualquer tipo de ciência humana que - mesmo que a conhecesse perfeitamente - não seria a ciência que salva e leva à vida eterna; que saiba aconselhar e ter caridade com os necessitados.

Numa palavra: pede-se ao sacerdote que aprenda a não estorvar a presença de Cristo nele, especialmente no momento em que realiza o Sacrifício do Corpo e Sangue e quando, em nome de Deus, na Confissão sacramental auricular e secreta, perdoa os pecados. A administração destes dois Sacramentos é tão capital na missão do sacerdote que tudo o mais deve girar à sua volta. As outras tarefas sacerdotais - a pregação e a instrução na fé - careceriam de base, se não estivessem por fim ensinar a ter intimidade com Cristo, a encontrar-se com Ele no tribunal amoroso da Penitência e na renovação incruenta do Sacrifício do Calvário, na Santa Missa.
Deixai que me detenha ainda um pouco na consideração do Santo Sacrifício: porque, se para nós é o centro e a raiz da vida cristã, deve sê-lo, de modo especial, na vida do sacerdote. Um sacerdote que, por culpa própria, não celebrasse diariamente o Santo Sacrifício do Altar, demonstraria pouco amor de Deus; seria como lançar na cara de Cristo que não compartilha da sua ânsia de Redenção, que não compreende a sua impaciência em entregar-se, inerme, como alimento da alma.

Sacerdote para a Santa Missa

Convém recordar, com reitarada insistência, que todos nós, sacerdotes, quer sejamos pecadores quer santos, quando celebramos a Santa Missa não somos nós próprios. Somos Cristo, que renova no altar o seu divino Sacrifício do Calvário. A obra da nossa Redenção cumpre-se continuamente no mistério do Sacrifício Eucarístico, no qual os sacerdotes exercem o seu principal ministério, e por isso recomenda-se encarecidamente a sua celebração diária que, mesmo que os fiéis não possam estar presentes, é um ato de Cristo e da sua Igreja .

Ensina o Concilio de Trento quena Missa se realiza, se contém e incruentamente se imola aquele mesmo Cristo que uma só vez se ofereceu Ele mesmo cruentamente no altar da Cruz... Com efeito, a Vítima é uma e a mesma; e aquele que agora se oferece pelo ministério dos sacerdotes é o mesmo que então se ofereceu na Cruz, sendo apenas diferente a maneira de se oferecer.

A assistência ou a falta de assistência de fiéis à Santa Missa não altera em nada esta verdade de fé. Quando celebro a Missa rodeado de povo, sinto-me satisfeito, sem necessidade de me considerar presidente de nenhuma assembleia. Sou, por um lado, um fiel como os outros, mas sou, sobretudo, Cristo no Altar! Renovo incruentamente o divino Sacrifício do Calvário e consagro in persona Christi, «na pessoa de Cristo», representando realmente Jesus Cristo, porque lhe empresto o meu corpo, a minha voz e as minhas mãos, o meu pobre coração, tantas vezes manchado, que quero que Ele purifique.

Quando celebro a Santa Missa apenas com a participação daquele que me ajuda, também aí há povo. Sinto junto de mim todos os católicos, todos os que creem e também os que não creem. Estão presentes todas as criaturas de Deus - a terra, o céu e o mar, os animais e as plantas -, dando glória ao Senhor da Criação inteira.

E especialmente - di-lo-ei com palavras do Concilio Vaticano II - unimo-nos no mais alto grau ao culto da Igreja celestial, comunicando e venerando sobretudo a memória da gloriosa sempre Virgem Maria, de São José, dos santos Apóstolos e Mártires e de todos os santos.
Peço a todos os cristãos que rezem muito por nós, sacerdotes, para que saibamos realizar santamente o Santo Sacrifício. Rogo-lhes que manifestem pela Santa Missa um amor tão delicado que nos leve, a nós, sacerdotes, a celebrá-la com dignidade - com elegância - humana e sobrenatural: com asseio nos paramentos e nos objetos destinados ao culto, com devoção, sem pressas.
Por que pressa? Têm-na por acaso os namorados ao despedir-se? Parece que se vão embora e não vão: voltam uma e outra vez, repetem palavras correntes como se acabassem de as descobrir... Não receeis aplicar exemplos do amor humano, nobre e limpo, às coisas de Deus. Se amarmos o Senhor com este coração de carne - não temos outro - não sentiremos pressa em terminar esse encontro, essa entrevista amorosa com Ele.
Alguns andam com calma e não se importam de prolongar até se cansarem leituras, avisos, anúncios. Mas, ao chegarem ao momento principal da Santa Missa, ao Sacrifício propriamente dito, precipitam-se, contribuindo assim para que os outros fiéis não adorem com piedade Cristo, Sacerdote e Vítima; nem aprendam a dar-lhe graças depois - com pausa, sem precipitações -, por ter querido vir de novo até nós.
Todos os afetos e necessidades do coração do cristão encontram na Santa Missa o melhor caminho: aquele que, por Cristo, chega ao Pai no Espirito Santo. O sacerdote deve pôr especial empenho em que todos o saibam e vivam. Não há atividade alguma que via de regra possa antepor-se à de ensinar e fazer amar e venerar a Sagrada Eucaristia.

O sacerdote exerce dois atos: um, principal, sobre o Corpo de Cristo verdadeiro; outro, secundário, sobre o Corpo Místico de Cristo. O segundo ato ou ministério depende do primeiro, e não ao contrário . Por isso, o que há de melhor no ministério sacerdotal é procurar que todos os católicos se aproximem do Santo Sacrifício cada vez com mais pureza, humildade e veneração. Se o sacerdote se esforça nesta tarefa, não ficará defraudado, nem defraudará a consciência dos seus irmãos cristãos.
Na Santa Missa adoramos, cumprindo amorosamente o primeiro dever da criatura para com o seu Criador:Adorarás o Senhor teu Deus e só a Ele servirás. Não adoração fria, exterior, de servo; mas íntima estima e acatamento, que é amor profundo de filho.
Na Santa Missa, encontramos a oportunidade perfeita de expiar os nossos pecados e os de todos os homens: para poder dizer, como São Paulo, que estamos cumprindo na nossa carne o que falta padecer a Cristo. Ninguém caminha sozinho no mundo, ninguém deve considerar-se livre de uma parte de culpa no mal que se comete sobre a terra, consequência do pecado original e também da soma de muitos pecados pessoais. Amemos o sacrifício, procuremos a expiação. Como? Unindo-nos na Santa Missa a Cristo, Sacerdote e Vítima; será sempre Ele quem carregará com o peso imenso das infidelidades das criaturas; das tuas e das minhas...

O Sacrifício do Calvário é uma prova infinita da generosidade de Cristo. Nós - cada um de nós - somos sempre muito interesseiros; mas Deus Nosso Senhor não se importa de que na Santa Missa ponhamos diante dEle todas as nossas necessidades. Quem não tem coisas a pedir? Senhor, aquela doença... Senhor, esta tristeza... Senhor, essa humilhação que não sei suportar por amor de Ti...

Queremos o bem, a felicidade e a alegria das pessoas da nossa casa; oprime-nos o coração a sorte dos que padecem fome e sede de pão e de justiça; dos que sentem a amargura da solidão, dos que, no termo dos seus dias, não recebem um olhar de carinho nem um gesto de ajuda. Mas a grande miséria que nos faz sofrer, a grande necessidade a que queremos pôr remédio é o pecado, o afastamento de Deus, o risco de que as almas se percam para toda a eternidade. Levar os homens à glória eterna no amor de Deus: esta é a nossa aspiração fundamental ao celebrarmos a Missa, como o foi a de Cristo ao entregar a sua vida no Calvário.
Acostumemo-nos a falar com esta sinceridade ao Senhor, quando desce, Vítima inocente, até às mãos do sacerdote. A confiança no auxílio do Senhor dar-nos-á essa delicadeza de alma que se traduz sempre em obras de bem e de caridade, de compreensão, de profunda pelos que sofrem e pelos que vivem artificialmente, fingindo uma satisfação oca, tão falsa, que depressa se converte em tristeza.

Agradeçamos, finalmente, tudo o que Deus Nosso Senhor nos concede pelo fato maravilhoso de se nos entregar Ele mesmo. Que venha ao nosso peito o Verbo Encarnado!... Que se encerre na nossa pequenez Aquele que criou céus e terra!... A Virgem Maria foi concebida imaculada para albergar Cristo no seu seio. Se a ação de graças há de ser proporcional à diferença entre o dom e os méritos, não deveríamos converter todo o nosso dia numa Eucaristia contínua? Não saiais do templo, mal acabeis de receber o Santo Sacramento. Tão importante é o que vos espera que não possais dedicar ao Senhor dez minutos para lhe dizer obrigado? Não sejamos mesquinhos. Amor com amor se paga.

Sacerdote para a Eternidade
Um sacerdote que vive deste modo a Santa Missa - adorando, expiando, impetrando, dando graças, identificando-se com Cristo -, e que ensine os outros a fazer do Sacrifício do Altar o centro e a raiz da vida do cristão, demonstrará realmente a grandeza incomparável da sua vocação, esse carácter com que foi selado, e que não perderá por toda a eternidade.

Sei que me compreendeis quando vos afirmo que, ao lado de um sacerdote assim, se pode considerar um fracasso - humano e cristão - a conduta de alguns que se comportam como se tivessem de pedir desculpa por serem ministros de Deus. É uma desgraça, porque os leva a abandonar o ministério, a arremedar os leigos, a procurar uma segunda ocupação que pouco a pouco suplanta a que lhes é própria por vocação e por missão. Frequentemente, ao fugirem do trabalho de cuidar espiritualmente das almas, tendem a substituí-lo por uma intervenção em campos próprios dos leigos - nas iniciativas sociais, na política -, aparecendo então esse fenômeno do clericanismo, que é a patologia da verdadeira missão sacerdotal.

Não quero terminar com esta nota sombria, que pode parecer pessimismo. Não desapareceu na Igreja de Deus o autêntico sacerdócio cristão; a doutrina é imutável, ensinada pelos lábios divinos de Jesus. Há muitos milhares de sacerdotes em todo o mundo que cumprem plenamente a sua missão, sem espectáculo, sem cair na tentação de lançar pela borda fora um tesouro de santidade e de graça que existiu na Igreja desde o princípio.
Saboreio a dignidade da finura humana e sobrenatural desses meus irmãos, espalhados por toda a terra. E de justiça que já agora se vejam rodeados da amizade, da ajuda e do carinho de muitos cristãos. E quando chegar o momento de se apresentarem diante de Deus, Jesus Cristo irá ao seu encontro, para glorificar eternamente aqueles que, no tempo, atuaram em seu nome e na sua Pessoa, derramando com generosidade a graça de que eram administradores.
Voltemos de novo, em pensamento, aos membros do Opus Dei que serão sacerdotes no próximo verão. Não deixeis de pedir por eles, para que sejam sempre sacerdotes fiéis, piedosos, doutos, entregues, alegres! Confiai-os especialmente à intercessão de Santa Maria, que torna ainda mais generosa a sua solicitude de Mãe para com aqueles que se empenham, por toda a vida, em servir de perto o seu Filho, Nosso Senhor Jesus Cristo, Sacerdote Eterno.