E desceu com eles, e foi para Nazaré, e era-lhes sujeito. E sua mãe guardava no seu coração todas estas coisas. E crescia Jesus em sabedoria, e em estatura, e em graça para com Deus e os homens. (Lc 2, 51-52).
«Jesus, crescendo e vivendo como um de nós, revela-nos que a existência humana, a vida comum e de cada dia, tem um sentido divino. Por muito que tenhamos considerado estas verdades, devemos encher-nos sempre de admiração ao pensar nos trinta anos de obscuridade que constituem a maior parte da vida de Jesus entre seus irmãos, os homens. Anos de sombra, mas, para nós, claros como a luz do Sol. Mais: resplendor que ilumina os nossos dias e que lhes dá uma autêntica projeção, pois somos cristãos comuns, com uma vida vulgar, igual à de tantos milhões de pessoas nos mais diversos lugares do mundo.
Assim viveu Jesus durante seis lustros: era fabri filius, o filho do carpinteiro. Virão depois os três anos de vida pública, com o clamor das multidões. E as pessoas surpreendem-se: Quem é este? Onde aprendeu tantas coisas? Pois a sua vida tinha sido a vida comum do povo da sua terra. Era o faber, filius Mariae, o carpinteiro, filho de Maria. E era Deus; e estava realizando a redenção do gênero humano; e estava a atrair a Si todas as coisas».
É Cristo que passa, 14
São Josemaria Escrivá sentia-se impelido por vocação divina a imitar especialmente a vida oculta de Jesus, a sua vida corrente, com ocupações tão semelhantes às da maior parte das pessoas. Por isso propunha este ideal nos seus ensinamentos.
«Sonho - e o sonho já se tornou realidade - com multidões de filhos de Deus santificando-se na sua vida de cidadãos comuns, compartilhando ideais, anseios e esforços com as demais pessoas. Preciso gritar-lhes esta verdade divina: se permaneceis no meio do mundo, não é porque Deus se tenha esquecido de vós, não é porque o Senhor não vos tenha chamado. Deus vos convidou a permanecer nas ocupações e nas ansiedades da terra, porque vos fez saber que a vossa vocação humana, a vossa profissão, as vossas qualidades não só não são alheias aos seus desígnios divinos, mas foram santificadas por Ele como oferenda gratíssima ao Pai!».
É Cristo que passa, 20
Outro aspecto que nunca faltava nas suas reflexões sobre os anos de Nazaré era a figura silenciosa e humilde de São José. Teve sempre muita devoção e um amor que, nos últimos anos da vida, se lhe foram tornando cada vez mais intensos, mais ternos e profundos.
«Mas se José aprendeu de Jesus a viver de um modo divino, atrever-me-ia a dizer que, sob o aspecto humano, ensinou muitas coisas ao Filho de Deus. Há qualquer coisa que não acabo de gostar no título de pai adotivo com que às vezes se designa José, porque oferece o perigo de sugerir que as suas relações com Jesus eram frias e externas. Certamente a nossa fé nos diz que José não era pai segundo a carne, mas essa não é a única paternidade possível.
José amou Jesus como um pai ama o seu filho, dando-lhe tudo o que tinha de melhor. Cuidou daquele Menino como lhe tinha sido ordenado, e fez dele um artesão: transmitiu-lhe o seu oficio. Por isso os vizinhos de Nazaré se referiam a Jesus indistintamente como faber e fabri filius : artesão e filho do artesão. Jesus trabalhou na oficina de José e junto de José. Como seria José, como teria atuado nele a graça, para ser capaz de desempenhar a tarefa de educar o Filho de Deus nos aspectos humanos?
Porque Jesus devia parecer-se com José: no modo de trabalhar, nos traços do seu caráter, na maneira de falar. No realismo de Jesus, no seu espírito de observação, no seu modo de se sentar à mesa e de partir o pão, no seu gosto em expor a doutrina de maneira concreta, tomando como exemplo as coisas da vida corrente, reflete-se o que foi a infância e a juventude de Jesus e, portanto, o seu convívio com José».
É Cristo que passa, 55