Áudio do Prelado: Obras de Misericórdia (Introdução)

Por ocasião do presente ano Jubilar, o Prelado comentará, mensalmente, cada uma das obras de misericórdia.

Introdução

O Jubileu Extraordinário, convocado pelo Papa Francisco, coloca a misericórdia no centro da atenção do caminhar cristão e o Santo Padre salienta que a misericórdia é uma “palavra chave para indicar o atuar de Deus para connosco, já que Ele não se limita a afirmar o seu amor, antes o torna visível e tangível”.

Cada um dos seus filhos pode ser testemunha do amor de Deus no decurso da sua própria vida e de que estamos chamados a responder com amor a esse Amor. O Papa convida todos a serem portadores da misericórdia de Deus, que tantas vezes experimentámos pessoalmente; e basta pensar nas inúmeras vezes que nos perdoa – sempre! – no sacramento da Penitência. Por isso, os próximos meses devem ser um “tempo propício para a Igreja, para que o testemunho dos crentes surja mais forte e eficaz”.

Essa proximidade do Senhor nunca poderá ficar numa palavra abstrata; deve traduzir-se, diariamente em obras, na conduta concreta de cada dia, nessas “intenções, atitudes e comportamentos que se verificam no viver quotidiano". O sucessor de Pedro manifestou que "a misericórdia de Deus mostra-nos a sua responsabilidade por cada um de nós. Ele sente-se responsável, deseja o nosso bem e quer ver-nos felizes, cheios de alegria e serenos. Neste mesmo comprimento de onda – continua o Santo Padre - se há-de orientar o amor misericordioso dos cristãos. Tal como ama o Pai celestial, assim hão-de amar os filhos. Como Ele é misericordioso, assim estamos nós chamados a ser misericordiosos uns com os outros”.

Neste sentido, adquirem um peso muito importante as obras de misericórdia que Nosso Senhor transmitiu à sua Igreja. Jesus Cristo – o “rosto da misericórdia do Pai”– convida os cristãos a voltarem constantemente e com atenção os olhos para Ele, com desejos de chegarmos a unir-nos à sua vida, de O imitar como os filhos pequenos imitam os pais ou os seus irmãos mais velhos.

São Josemaria Escrivá, fundador do Opus Dei, cultivou com paixão durante o seu caminhar terreno as obras de misericórdia corporais e espirituais, seguindo Jesus Cristo. Com razão pôde escrever numa das suas homilias: “Compreende-se muito bem a impaciência, a angústia, os desejos inquietos daqueles que, com uma alma naturalmente cristã, não se resignam diante da injustiça pessoal e social que pode criar o coração humano. Tantos séculos de convivência entre os homens e, ainda, tanto ódio, tanta destruição, tanto fanatismo acumulado nos olhos que não querem ver e em corações que não querem amar”. Até aqui, São Josemaría.

A seguir, pormenorizou alguns dos males que afligem o mundo: “Os bens da terra – detalhava São Josemaria – repartidos entre uns poucos; os bens da cultura, encerrados em cenáculos. E, fora [desses lugares], fome de pão e de sabedoria, vidas humanas que são santas, porque vêm de Deus, tratadas como simples coisas, como números de uma estatística". Aquí termina a citação do Fundador do Opus Dei.

Diante da ausência de misericórdia e de autêntica fraternidade, não pode ter lugar deixar-se levar pelo desalento, mas antes acolher o conselho de São João da Cruz: " Onde não há amor põe amor e terás amor". Estamos, todos! chamados a ser outros Cristos, o próprio Cristo e, assim, atuar em seu nome, contagiando a caridade em todos os lugares. Neste sentido, também São Josemaría salientava que Jesus Cristo "continua a convidar-nos a que ponhamos em prática esse mandamento novo do amor, o mandatum novum(…). Há que reconhecer Cristo, que nos sai ao encontro nos nossos irmãos os homens. Nenhuma vida humana é uma vida isolada, entrelaça-se antes com outras vidas, com a nossa. Nenhuma pessoa é um verso solto, antes fazemos todos parte de um mesmo poema divino, que Deus escreve com o concurso da nossa liberdade”.

Talvez alguém pudesse pensar que – sobretudo nos países mais avançados – os progressos na assistência social, na saúde, no trabalho, etc., tornariam desnecessárias, ou mesmo supérfluas, as tradicionais obras de misericórdia: mas não é assim! Mesmo nas nações mais desenvolvidas, muitas pessoas vivem no umbral da pobreza, carecem dos serviços mais elementares ou sofrem a solidão ou de abandono, ainda que disponham de meios materiais. Certeiramente, o fundador do Opus Dei observava, muitos anos atrás, que, quando as circunstâncias históricas parecem ter superado a miséria ou a dor, precisamente então, torna-se mais urgente esta agudeza da verdadeira fraternidade cristã, que sabe adivinhar onde há necessidade de consolo, também no meio de um aparente bem-estar geral.

Com a ajuda de Deus, ao longo destes meses, proponho-me fazer algumas considerações sobre as catorze obras de misericórdia, espirituais e corporais, com a intenção de que penetrem mais profundamente na nossa existência corrente. Nos afazeres de cada jornada – no trabalho, na vida em família, ns relações com os outros – o Mestre convida-nos a identificar-nos com Ele.

Dessa forma, o nosso caminhar terreno com Jesus Cristo poderá converter-se numa “escola de misericórdia”.